Resenha: Duna - Café & Espadas

12 de setembro de 2014

Resenha: Duna

Título – Duna
Título Original - Dune
Autor – Frank Herbert
Páginas – 650
Editora – Aleph 

A vida do jovem Paul Atreidesestá prestes a mudar radicalmente. Após a visita de uma mulher misteriosa, ele é obrigado a deixar seu planeta natal para sobreviver ao ambiente árido e severo de Arrakis, o 'Planeta Deserto'.

Envolvido numa intrincada teia política e religiosa, Paul divide-se entre as obrigações de herdeiro e seu treinamento nas doutrinas secretas de uma antiga irmandade, que vê nele a esperança de realização de um plano urdido há séculos.

Ecos de profecias ancestrais também o cercam entre os nativos de Arrakis. Seria ele o eleito que tornaria viáveis seus sonhos e planos ocultos?



Nos anos 60 a literatura foi presenteada com diversas obras grandiosas de ficção científica e fantasia. Algumas obras foram lançadas e instantaneamente alcançaram os mais altos patamares no conceito dos críticos literários, e outras  que foram lançadas anos antes – somente receberam seus devidos méritos, recebendo a alcunha de "clássicos".

Para a maioria dos leitores, é bem fácil traçar uma linha que divide a ficção científica e a fantasia de forma bem heterogênea. As características são tão diferentes entre si, que classificar qualquer obra em uma desses estilos de história se torna tarefa simples, correto? Bom, talvez nem tanto.

Frank Herbert conseguiu fazer em Duna algo que eu particularmente nunca havia visto antes: mesclar elementos de sci-fi e fantasia de uma forma tão pura, que é impossível separá-los dentro da história. Some a isso um universo repleto de culturas, rituais e vida, tudo criado por uma mente extremamente imaginativa e produtiva. Uma história com um enredo que prende o leitor nas entranhas de uma teia de tramas, traições e segredos, tudo regido por uma escrita primorosa e por muitas vezes poética. Um império inescrupuloso, um planeta extremamente hostil e um jovem que levará um povo renegado a tomar as rédeas de todo o governo galáctico.

Eis Duna o primeiro volume da série As Crônicas de Duna.  Uma obra clássica, que todo bom leitor tem a obrigação de ler.

Tudo tem início quando o Duque Leto, da casa Atreides é obrigado pelo Imperador Padixá a abandonar seu planeta natal Caladan – um lugar belo e rico em recursos naturais – e ir com toda a sua família, serviçais e homens de armas para o planeta Arrakis, também conhecido como Duna. Um lugar extremamente árido, com uma escassez de água que torna a sobrevivência de qualquer indivíduo quase impossível, lar do povo fremen -renegados violentos e detentores de uma tecnologia que permite a sobrevivência em Arrakis  e a presença dos terríveis Vermes da Areia: monstros gigantescos que devoram qualquer coisa que caminhe sob as areias dos desertos.

No entanto, Duna é o único lugar onde a raça humana pode obter a melange – ou simplesmente a especiaria – uma substância utilizada para produção de vários bens de consumo e com propriedades revitalizadoras para o corpo. A economia do império e de todas as casas – maiores e menores – basea-se na extração e refinamento da especiaria: quem controla Arrakis, controla o poder econômico.


O povo Fremen e os temíveis Vermes.

O que o Duque Leto não sabe é que esta ordem vinda diretamente do imperador esconde um ardiloso plano contra a sua casa. O império intergaláctico acredita que está sendo ameaçado pelo crescimento da Casa Atreides, então solidifica uma aliança com os Harkonnen: rivais dos Atreides desde os princípios do universo criado pelo autor para a sua obra. Mais precisamente, desde uma grande guerra entre homens e máquinas que ocorreu nos primórdios da mitologia de Duna.

Sendo assim, Leto conduz toda a sua corte para o planeta Duna, e o que já era uma mudança de vida difícil de aceitar, acaba se tornando uma infernal e intrincada luta pela sobrevivência ante os perigos naturais e as tentativas de assassinato por parte dos Harkonnen. 

Mas, contrariando a aparência, a história não gira em torno do Duque Leto, mas sim do seu filho Paul Atreides, um jovem que possui características únicas e especiais que poderão fazer dele um messias para o povo fremen e poderá mudar todo o destino do Universo. É neste momento que o enredo grandioso e os belíssimos tons da narrativa de Frank Herbert começam a ganhar suas formas – maleável como a areia, mas tornando-se subitamente rígida como a lâmina de uma faca em vários momentos.

Frank Herbert alicerçou sua obra sobre três colunas: religião, política e economia. As três sendo muito bem aproveitadas e exploradas durante toda a narrativa.

A religião é representada pela figura emblemática das Bene Gesserit, uma ordem composta unicamente por mulheres, e que treinam suas capacidades mentais, controle de emoções e persuasão indutiva ao máximo, e usando esses seus talentos para influenciarem e manipularem a política de acordo com os seus interesses. Me arrisco a dizer que esse é o tema mais recorrente durante toda a narrativa, e o papel da religião e a crença da existência de um ser humano superior que conduz a humanidade a um paraíso – seja celestial ou terrestre -  são os mais fundamentais do enredo, e é o que move o destino de Paul, Duna e dos outros fios que formam a linha da ideologia central da história.

A política e a economia são muito bem experimentadas nesta obra, por meio das ações mais cruéis que elas podem inferir. Assassinatos, corrupção e planos ardilosos movem, em segundo plano, as engrenagens que fazem todo o sistema - gerenciado pelo império – funcionar de forma bem elaborada. Por mais que em certos momentos os diálogos sejam extensos e arrastados entre os personagens, a atmosfera que sentimos é a de tensão conspirativa contínua, e isso não deixa a narrativa cair na mesmice.

Os personagens de Duna vivem constantes e profundas dualidades. Paul recebeu os treinamentos Bene Gesserit mesmo sendo um homem. Sua mãe, Lady Jéssica, é uma Bene Gesserit experiente e que tentará usar o próprio filho para concretizar os planos de sua irmandade. Mas ela mesma não tem mais tanta certeza se realmente vale a pena sacrificar tudo por uma “descendência superior”.

Paul, no meio de um grande turbilhão de acontecimentos terríveis, se vê obrigado a endurecer e aceitar a sua condição. A condição para o qual foi preparado desde a infância. Esses conflitos internos – que obviamente não afligem somente esses dois personagens - são a essência do mergulho que o autor faz no íntimo sentimental de cada indivíduo desse núcleo da história, com descrições poéticas e sem ressalvas de expor as fraquezas dos mais fortes.

Os personagens secundários também são amplamente trabalhados, e não estão no enredo só para fazer número: todos participam de forma efetiva e possuem papéis fundamentais para o desenrolar dos acontecimentos. 

A descrição da beleza de todos os rituais é detalhada e ajuda o leitor a se sentir mais envolvido com todos os elementos que compõem a obra de Frank Herbert. Todos os significados por trás de cada gesto, cada análise fria das reações humanas ante os acontecimentos inevitáveis, a tecnologia vivendo em perfeita harmonia com o rudimentar, tudo está muito bem encorpado nessa história. Duna é, realmente, uma obra que transcende o comum.

A edição que li foi a da Editora Aleph. Esse foi o primeiro contato que tive com alguma publicação desta editora, e devo confirmar a boa fama que ela possui. A diagramação é perfeita, os apêndices são extremamente informativos e muito bem organizados, e facilitam a compreensão de todos os termos usados pelos personagens e do aspecto ambiental do planeta Arrakis. A capa e a lombada do livro são daquelas de ganhar destaque na estante. Uma ótima edição, feita por uma ótima editora.

Adaptação cinematográfica de Duna - 1984

Se eu for parar para fazer um resumo da história, a resenha ficaria gigantesca e a qualidade literária do livro não seria esmiuçada como se deve. Então isso que falei é o suficiente para que você tenha uma boa base para mergulhar nos desertos de Arrakis e montar um Verme da Areia nessa história incrível. Mas acredite: o enredo se destrincha de uma forma tão mirabolante que o primeiro livro é somente uma porta de entrada para todo esse universo vasto e belo criado pelo autor.

O livro não é tão fácil de ler. Requer uma atenção maior e foco redobrado na escrita, que é um pouco mais rebuscada.Porém é uma leitura recompensadora e que deixará o leitor com sede (trocadilho não proposital) pela continuação, curioso pelo destino de Paul e seus aliados e satisfeito com o encerramento deste primeiro volume.

Recomendadíssimo.

História
Escrita
Revisão
Diagramação
Capa

Um comentário:

  1. Ótima resenha de um dos meus livros favoritos. E uma das minhas maiores inspirações como escritor.

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