Título – As Mentiras de Locke Lamora
Título Original – The Lies of Locke Lamora
Autor – Scott Lynch
Páginas – 463
Editora – Arqueiro
Sinopse
O Espinho é uma figura lendária: um espadachim imbatível, um especialista em roubos vultosos, um fantasma que atravessa paredes. Metade da excêntrica cidade de Camorr acredita que ele seja um defensor dos pobres, enquanto o restante o considera apenas uma invencionice ridícula.
Franzino, azarado no amor e sem nenhuma habilidade com a espada, Locke Lamora é o homem por trás do fabuloso Espinho, cujas façanhas alcançaram uma fama indesejada. Ele de fato rouba dos ricos (de quem mais valeria a pena roubar?), mas os pobres não veem nem a cor do dinheiro conquistado com os golpes, que vai todo para os bolsos de Locke e de seus comparsas: os Nobres Vigaristas.
O único lar do astuto grupo é o submundo da antiquíssima Camorr, que começa a ser assolado por um misterioso assassino com poder de superar até mesmo o Espinho. Matando líderes de gangues, ele instaura uma guerra clandestina e ameaça mergulhar a cidade em um banho de sangue. Preso em uma armadilha sinistra, Locke e seus amigos terão sua lealdade e inteligência testadas ao máximo e precisarão lutar para sobreviver.
“- A única pessoa que se safa com os golpes de Locke Lamora...
...é Locke Lamora...
...por que nós achamos que os deuses o estão poupando para uma morte
realmente grandiosa. Algo com facas e ferros incandescentes...
... e cinquenta mil espectadores aplaudindo”
Já faz algum tempo que anunciamos
aqui o lançamento de As Mentiras de Locke
Lamora pela Editora Arqueiro. Em março, para ser mais exato.
O livro havia sido “indicado” por
Patrick Rothfuss, autor de O Nome do
Vento e O Temor do Sábio e após
isso, não demorou muito tempo para que o primeiro volume da série dos Nobres
Vigaristas chegasse as livrarias brasileiras.
De primeira (como de praxe) olhei
o livro com um certa desconfiança. Afinal que é esse tal de Scott Lynch?
História de ladrões? Acho que já vi esse filme... Mas não! Locke Lamora foi uma
agradável surpresa nesse começo de ano e já afirmo de antemão: não sei o que
vou ler daqui até o final de 2014, mas com certeza esse livro vai estar entre
os 5 melhores. Sem sombra de dúvidas.
Usando uma narrativa divertida,
leve, agradável e bem humorada, Lynch coloca o leitor dentro de um galeão velho
com velas poeirentas e o leva para Camorr, uma cidade-estado (como muitas
outras do mundo criado pelo autor) feita de várias ilhas interligadas por pontes
e rios, o que me lembrou bastante a cidade de Veneza, na Itália. Aliás, é
possível notar vários elementos um tanto quanto italianos nessa história: os
nomes de vários personagens, as pronúncias das palavras, os aspectos
arquitetônicos das edificações e até mesmo o apego a culinária, tudo é bem impregnado
de uma influência desse país.
Mas as semelhanças param por aí.
A estrutura dessa imensa cidade
também está repleta de um material misterioso chamado vidrantigo, que nada mais é que os resquícios de uma antiga
civilização alienígena denominada Ancestres pelos camorris. Isso foi um toque
exótico que o autor deu ao seu mundo, que embora seja muito instigante, não é
muito explorado, mas também não influencia muita coisa no enredo, porém são
esses toques sutis que dão cores ao mundo fantástico criado para ser o
cenário das aventuras e tramoias de Locke e seus amigos. E falando em enredo,
vamos a ele.
Locke Lamora é um gênio.
Simplesmente um gênio. Chega a dar medo.
O seu instinto de roubar e a
sutileza com a qual ele planeja e aplica seus golpes é de deixar qualquer
ladrão experiente, ou até um deputado brasileiro, com o queixo no chão. Só há
um problema com ele, e um problema muito grave: sua inconsequência.
Como qualquer gênio, Locke não é
completamente compreendido, e o alcance (por vezes desastroso) dos seus golpes
causa espanto no seu primeiro garrista (líder
de uma gangue), um homem cruel conhecido como O Aliciador, nome que ganhou com
a fama de preparar vários órfãos para ingressarem em algumas das inúmeras
gangues que aterrorizam os mais humildes em Cammor.
Sendo assim, Locke é vendido para
o Sacerdote Cego, líder dos Nobres Vigaristas, uma gangue bem diferente das
demais. Por que diferente? Bom, para entender melhor você deve saber que em
Camorr existe um acordo feito entre os nobres condes (governantes da cidade) e
o Capa Barsavi (líder magnânimo do mundo do crime) que consiste em uma troca de
favores: os ladrões tem total liberdade de roubar os habitantes mais humildes e
os comerciantes das áreas mais pobres de Camorr sem serem importunados pela
guarda local, mas não podem tocar em nenhum membro da nobreza camorri nem na
guarda. Isso é a Paz Secreta um
acordo que exala uma corrupção deslavada e é o principal plano de fundo para
toda a trama do livro.
Os Nobres Vigaristas se
diferenciam das demais gangues por ser a única que rouba diretamente dos
nobres, violando totalmente a Paz Secreta. Mas eles não assaltam a mão armada,
na calada da noite, ou batem a carteira de um conde enquanto ele vai ao templo
do deus da fortuna fazer suas preces... não, não. Locke e seus amigos (os
gêmeos Calo e Galdo Sanza e Jean Tannen, um guerreiro letal) são instruídos nas
artes mais finas e sofisticadas da vigarice, como a atuação, o disfarce, a
lábia... e é dessa forma que eles enganam até mesmo o próprio Capa Barsavi.
Outra coisa bem interessante
nessa obra é a forma como Lynch a narra, intercalando entre o passado de Locke,
sua infância no templo de Perelandro, onde ele aprendeu a ser mais cuidadoso e
estratégico, e o tempo presente, onde o enredo atinge seus pontos cruciais, com
um Locke já adulto, agora sendo o garrista
dos Nobres Vigaristas (aparentemente o Sacerdote Cego morreu, mas o livro não
explica como isso aconteceu), mais maduro, mas ainda com aquele quê de
imprudência e ganância exagerada, e sofrendo por uma mulher que está ausente, e
esse primeiro volume não dá maiores explicações quanto a isso. Paralelo a tudo
isso, Locke e sua turma estão tentando aplicar um golpe milionário em Dom
Salvara, um dos nobres de Camorr, e justo quando entra em cena o Rei Cinza, uma
espécie de serial killer que só mata garristas, o que coloca nosso
protagonista em uma posição de risco. Mas os planos deste assassino vão muito
além do simples instinto de matança, e sua principal motivação pode ser resumida em uma
única palavra: vingança.
Como deu pra notar, a trama é bem
abrangente e possui vários núcleos e personagens com relevância para o enredo.
Por um momento o leitor pode se questionar se o autor será capaz de manter o
ritmo e de não se perder no meio de todos esses eventos. Mas isso não acontece
de forma alguma.
Lynch consegue sim, e de forma
impecável, manter o foco e guiar muito bem o leitor por duas histórias
igualmente cativantes (o passado de Locke e os acontecimentos presentes)
enquanto explora aos poucos o mundo que abriga Camorr e tudo o que há além
dela.
O universo criado pelo autor é
rico, colorido, por vezes até surreal de tão belo, com culturas marcantes e
povos bem caracterizados em sua língua, vestimentas e paladares. Realmente um
ótimo trabalho.
Sobre a edição. A Editora
Arqueiro (agora parceira do Café & Espadas) fez um ótimo trabalho com esse
livro. Boa diagramação, erros leves de revisão e uma capa bem bonita, que já
nos dá uma boa ideia do ambiente no qual o leitor irá entrar durante a leitura
da obra. Além disso, temos no final o prelúdio e um trecho do primeiro
capítulo do segundo volume da série, Mares
de Sangue.
Porém senti falta de um bom mapa,
esse adereço que já se tornou uma constante em edições de livro de fantasia.
Não fico esperando esse tipo de anexo em livros, mas no caso deste livro em
especial, senti. Pois são tantos lugares e tantas direções que um mapa poderia
ajudar numa visualização melhor. Mas isso é só um pequeno detalhe, nada que
comprometa a obra.
Resumindo o que posso dizer sobre
As Mentiras de Locke Lamora: leia o
quanto antes!
Não é todo dia que vemos uma obra
que esbanja tanta originalidade, personagens tão marcantes e uma trama tão bem
elaborada narrada de forma brilhante. Com doses de um humor bem cara de pau,
lutas frenéticas e sangrentas, reviravoltas imprevisíveis e boas citações sobre
a “filosofia dos ladrões”, essa série veio para garantir seu espaço como uma
das melhores publicações desse ano, até o momento. E não seria exagero dizer
que ela renderia um bom filme.
Recomendo fortemente uma viagem
à Camorr... mas cuidado com as suas moedas.
História
Escrita
Revisão
Diagramação
Capa
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